terça-feira, 16 de novembro de 2010

ARTIGO: Como acabar com um policial!


Quando entramos na PRF, por mais céticos que sejamos com relação ao serviço público, temos esperança de fazer algo de melhor para a sociedade. O clima do curso de formação, da formatura, a lotação inicial... as primeiras abordagens; tudo é mágico, novo, desconhecido. A vontade que temos de crescer, de fazer o que é certo, de lutar pela polícia e pela sociedade é enorme. Depois participamos de alguns cursos operacionais, alguns pagam do próprio bolso, bem como a compra de alguns materiais indispensáveis para o serviço. Alguns são mais entusiasmados e participam de cursos em outras forças onde são levados ao extremo. Passamos frio, fome, sono, sede, estresse físico e psicológico, para trazer o que há de melhor em outras forças para a nossa PRF. Muitos aqui se especializam em várias áreas como identificação veicular, fiscalização de peso, de produtos perigosos, em crimes ambientais; muitas vezes sabendo até mais sobre essas matérias do que alguns servidores dos órgãos específicos desta área. Passamos as madrugadas atrás de bandidos e nos motivamos com o simples fato de recuperarmos um veículo roubado ou prender um traficante.

O tempo começa a passar e vemos que não deveríamos comprar alguns materiais básicos e baratos que deveriam ser fornecidos pelo Departamento. Começamos a ver que talvez certos tipos de fiscalização parecem incomodar, mesmo que estejamos ali para aquele tipo de fiscalização também. Vamos tomando conhecimento que um ou outro colega que não é tão diligente no serviço tem algumas regalias que nunca tivemos. Alguns tem a experiência de não receber o mínimo apoio ao agir corretamente contra algum usuário que se julgue acima da lei. Começamos a ver que o salário não é tudo no trabalho policial, pois alguns estão aqui para algo mais do que unicamente receber seu salário no fim do mês. Alguns tem ideais e querem ver o fruto do seu trabalho. Queríamos que o traficante que foi preso, continuasse preso e fosse julgado. Gostaríamos de não sermos vistos com desconfiança por outros órgãos como Ministério Público e Judiciário. Não obstante os obstáculos externos, ainda enfrentamos os problemas internos. Necessitamos do apoio da nossa chefia para melhor desenvolvermos nosso trabalho. Porém, em algum momento essa nossa vontade toda vai se esvaindo, vai enfraquecendo, vai sumindo...

Alguns teimosos ainda insistem em lutar, porém a maioria é vencida pelo que há de pior no serviço público e são tomados pela apatia. Onde é que se desliga essa máquina de moer bons policiais? É necessário ouvir o grito desesperado de quem está aqui para fazer uma polícia forte. Se queremos construir ou consolidar a PRF como órgão forte de segurança pública, assim como quem nos dirige, por que divergimos tanto? Por que não valorizar o bom policial? O administrador que não sabe ouvir uma crítica à sua administração e leva tudo para o lado pessoal, precisa entender que é sobre a crítica que pode crescer pois ela aponta pontos fracos que deveriam ser melhorados, ou talvez analisados de forma diferente. Nas teorias de administração modernas, o "feedback" tão ansiado pelos administradores é justamente aquele que aponta falhas em sua administração, pois ao analisar tais críticas e corrigir seus pontos fracos, estes administradores dão um passo para melhorarem sua administração. Porém no serviço público, com sua administração arcaica, a crítica é tomada como uma ofensa pessoal e o crítico como inimigo declarado. Dizer que tal situação administrativa é absurda, é tomada como uma ofensa à moral da genitora dos administradores.

Essa falta de tato ao lidar com estas questões demonstram claramente o despreparo de grande parte de nossas chefias e aí começa um ciclo vicioso que parece não ter mais fim. Ao ser criticado por policiais produtivos, que querem ver essa polícia forte e querem trabalhar pela mesma, e são estes geralmente os mais críticos, os administradores, ao invés de saber lidar com essas críticas, tentar resolver o problema, criar um clima favorável ao trabalho, recebem essas críticas como se pessoais fossem e começam a tirar as oportunidades daqueles policiais que produzem. É como se o diretor de uma fábrica inviabilizasse a produtividade de um operário pelo mesmo emitir críticas que se fossem analisadas e sanadas, poderiam aumentar em muito a produtividade da fábrica toda. Policiais cortados de operações, de cursos, sendo mal avaliados nas injustas progressões são alguns dos muitos fatores que desgastam o verdadeiro policial.

Aqui convém fazer uma ressalva, pois tudo isto só tem fundamento se ambos, a administração e os críticos, tiverem os mesmos objetivos que é o de fazer a PRF crescer. Se quem critica só o faz com o intuito de desestabilizar a administração ou se quem administra não tem o mínimo interesse de trabalhar para o crescimento da PRF, tudo o que foi falado aqui de nada vale. Porém, se a administração quer ver a produtividade de seus policiais aumentar, não é com perseguições e ameaças que fará isso acontecer. Vivemos uma época onde o desânimo com o serviço contagia até os mais operacionais, que sempre vestiram a camisa da PRF, que não fazem questão de migalhas em prol de algo maior. Porém quando o clima encontrado é de perseguição, de desconfiança, de humilhação, de assédio moral, não há nada mais que se esperar do efetivo do que a total apatia.

Não adianta tentar mascarar os números pífios da produtividade com comandos de radar móvel, pois o radar não prende ninguém, não apreende drogas e nem veículos clonados, pelo contrário, os multa, o que demonstra mais ainda a fragilidade operacional dessa polícia.

Está na hora de uma ruptura de paradigmas, que, para quem não sabe o que é, é a mudança de postura, de visão... é colocar o pé no freio e tentar atingir os objetivos da polícia por outros métodos que ainda não foram usados, porém diferentes do que tem sido. O efetivo não é bobo e pode ter uma grande parte inconformada que fica calada, porém tem sempre alguns que não aguentam calados e buscarão amparo judicial para as situações que julgam ser ilegais, só que depois que tais casos forem parar na justiça, não haverá mais espaço para nenhum tipo de conciliação ou retratação, pois quem bate esquece, mas quem apanha nunca esquece.


Alexandre de Oliveira Azevedo
Diretor Jurídico do SINDPRF/CE

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