quinta-feira, 24 de junho de 2010

Portaria 030, FENAPRF, SINPRFS, DPRF e os PRF´s da atividade-fim



Uma abordagem bem feita, no padrão, demora, no mínimo, 15 minutos. Parar o veículo, verificar documentação do carro e do condutor(sua autencidade), consultar indivíduo(s) no Infoseg, o veículo, verificar chassi, número do motor, entrevistar condutor e passageiros, verificar porta-malas, fazer revista pessoal em caso de fundada suspeita e por aí vaí...
Quem fez curso de formação sabe que não se aborda sozinho. É o mais básico mandamento do policiamento ostensivo. Então, se um PRF está fazendo as acões descritas acima, o outro fica somente na segurança, de olho no movimento, arma longa na posição sul, pronto para dar o primeiro combate para repelir uma pretensa agressão ao colega que está focado na fiscalização.
Considerando que a portaria 030 cobra 25 procedimentos por policial(em cada plantão) e que e que um está “imobilizado” na cobertura enquanto o outro aborda, temos que multiplicar 50 procedimentos autônomos por 15 minutos cada um, e isso dá um total de 12 horas e 30 minutos de abordagens ininterruptas. Isso num mundo ideal, com um carro passando e sendo parado no mesmo segundo em que o anterior é liberado, e considerando que os procedimentos não resultarão em multas, DRV´s, RRC´s e os muitos documentos que temos que preencher. Caso isso aconteça, o procedimento que seria de 15 minutos, pode chegar ao dobro ou ao triplo desse tempo.
Vale considerar também, que nessa conta não entram os atendimentos a acidentes ou ocorrências de natureza policial. Nesses casos, os policiais perdem horas no deslocamento, atendimento e resolução desses eventos.
Como a conta é mensal, o que você não faz num dia, acumula pro outro serviço. E é nessa lógica que o PRF da atividade-fim tem de escolher: ou faz abordagens mal-feitas no atacado e é avaliado ou faz bem feito, no padrão, e não chega às metas estabelecidas. Considerando o baixo efetivo, os PRF´s são praticamente obrigados a abordarem sozinhos, geralmente selecionando veículos novos, que não gerarão procedimentos de fiscalização para poder bater as metas de fiscalização estabelecidas pelo DPRF. Com isso a produtividade-resultado diminui, com a queda das multas, apreensões e prisões. Por outro lado os relatórios maquiados, mostram que mais carros e pessoas foram fiscalizadas, geralmente velhinhos, velhinhas e crianças. A fundada suspeita foi pro espaço e, com isso, a queda qualitativa do serviço de policiamento de rodovia fica evidente na diminuição da produtividade real.
Foi dentro dessa lógica que os colegas de Lajes-RN foram assaltados por marginais em novembro do ano passado. O colega, muito provavelmente, estava abordando sozinho, à noite, para fechar os seus procedimentos pendentes.
Além de toda essa querela, os policiais perdem horas no computador digitando esses dados obtidos para os relatórios. Isso provoca a redução das rondas, do policiamento e da fiscalização efetivas.
A portaria 030 criou esse grande imbróglio. Criada por um teórico, sem muita experiência da atividade-fim, ela privilegia o relatório em detrimento ao resultado. É inegável que ela fragiliza a segurança do já pífio efetivo que tenta, meio que na marra, trazer algum lampejo de segurança pública nas rodovias federais. Ao se adotar o método quantitativo do relatório, deixamos de prestar um serviço público de qualidade para a sociedade brasileira.
Mesmo com todo essa problemática, a FENAPRF e os sindicatos não responderam à altura. Mesmo com todo o efetivo prejudicado, as atitudes foram tímidas. Uma ação na justiça tramita para o óbvio: qualquer estudante de direito sabe que não cabe ao Judiciário se meter nos limites da discricionariedade do Estado. Por mais absurda que seja a portaria, ela não é ilegal e por isso não será invalidada pelo Judiciário.
A negociação pela revogação, não houve. Negociação exige meio de coerção. E negociação sem meio de coerção, não é negociação, é pedido. E foi por isso que o DPRF se sentiu à vontade em não mudar absolutamente nada da portaria, muito menos revogá-la. Negou a possibilidade de revogação porque tinha certeza que não encontraria reação sindical da FENAPRF para sua ação pouco democrática. Um sindicalismo forte diria: ou revoga ou eu…
Essa portaria não encontra similar em nenhuma instuição policial brasileira. Ao falarmos dela para colegas de outras forças, provocamos risadas. É por esse motivo que perdemos tempo discutindo algo tão aburdo e desmotivado enquanto eles discutem melhorias.
Fica difícil imaginar o porquê desta portaria ainda estar em vigor. Enquanto baixamos a qualidade da fiscalização e perdermos tempo digitando burocracias desnecessárias, a criminalidade e os infratores de normas de trânsito agradecem. Enquanto a Portaria 030 estiver em vigor, mais foragidos da justiça passarão despercebidos, mais toneladas de drogas passarão em bagagens que não puderam ser revistadas nos nossos postos, muitas armas de fogo circularão incólumes e infratores de trânsito se multiplicarão impunes, pela ausência de um policiamento de qualidade.
A sociedade brasileira lamenta, mas a criminalidade agradece...


O PRF Filipe é bacharel em Direito pela UFRN e pós-graduando em Ciências Penais pela rede LFG-UNIDERP.


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